Na prática, a medida passa a permitir que Estados e municÃpios decidam onde querem aplicar os recursos repassados pela União para a saúde.
Até então, esses recursos eram "carimbados" e enviados para uso especÃfico em determinadas áreas, sem que pudessem ser usadas em outras.
O formato de transferência das verbas de financiamento também deve mudar.
Hoje, a parcela repassada pela União para atividades e serviços em saúde é dividida e enviada por meio de seis blocos, que separam áreas especÃficas –caso, por exemplo, da "atenção básica", que engloba o atendimento nas unidades de saúde; da "vigilância", que envolve o combate a vetores de doenças, e da "média e alta complexidade", voltada a financiar atendimento hospitalar, entre outras.
A ideia, agora, é que as verbas de custeio sejam repassadas por meio de um só bloco, em uma espécie de "caixa único". Já os recursos destinados a financiamento de obras e outros investimentos devem continuar a ser repassados por meio de um bloco especÃfico.
As novas regras passam a valer em 31 de janeiro de 2018.
PREOCUPAÇÃO
O novo modelo de financiamento do SUS, porém, já era estudado desde o inÃcio deste ano, conforme a Folha divulgou à época.
A medida gera preocupação entre especialistas, que temem que, a poucos meses das eleições, áreas menos "visÃveis" da saúde possam perder recursos -caso da vigilância e combate ao Aedes aegypti, por exemplo.
Outro temor é que áreas tidas como "pilares" do SUS, caso da atenção básica, percam o incentivo que obtiveram nos últimos anos com a separação dos repasses por blocos especÃficos de recursos. "Se olhar durante esses anos, não houve diminuição da proporção gasta em atendimentos de média e alta complexidade [caso dos hospitais], que sempre foi maior, mas houve aumento importante na atenção básica", diz a economista especialista em saúde Eli Iola Gurgel, professora da Faculdade de Medicina da UFMG, para quem o maior incentivo a essa etapa tende a diminuir a pressão nas demais.
Para Gurgel, a mudança nas regras também traz risco de aumento das pressões do mercado sobre o SUS.
"O que temo é que ao invés de caminhar para o fortalecimento da atenção básica, que é a porta de entrada para o SUS, o gestor se veja forçado a resolver problemas imediatos, como consultas e exames especializados, por exemplo, e vá comprar esse serviços das clÃnicas e fornecedores privados", completa.
Já para o ministro, a mudança "desburocratiza" o repasse de recursos ao SUS e passa a adequar a aplicação de recursos à "realidade" dos municÃpios.
"O que estamos permitindo é mais flexibilidade para que um municÃpio proponha como deve gastar. Hoje mandamos recurso carimbado igual para todo mundo, como se fosse igual uma cidade no Amazonas com uma de uma região metropolitana. E não é", afirma.
A cada ano, o Ministério da Saúde repassa cerca de R$ 75 bilhões a Estados e municÃpios.
Segundo o ministro, a regra atual faz com que prefeituras deixem de investir parte dos recursos federais enviados –a estimativa é que ao menos R$ 7 bilhões ficaram parados nas contas neste ano.
Questionado sobre o risco de queda de uso de recursos em algumas áreas, Barros afirma que a pasta deve verificar, por meio de novos sistemas de monitoramento, se a aplicação corresponde ao que está definido nos planos municipais de saúde, documento que estabelece as ações prioritárias a serem realizadas.
Ao menos 400 municÃpios, porém, não possuem esses planos. De acordo com o ministério, a ideia é que um novo prazo para que essas prefeituras apresentem esse planejamento seja definido até janeiro. Caso isso não ocorra, o ministério estuda suspender o repasse de recursos.
"De inÃcio talvez não tenhamos solução nesse sentido, até porque nossa intenção é que os gestores apresentem seus planos. Vamos ter que dar uma margem de tempo para que lancem essas informações", diz o diretor-substituto do departamento de articulação do ministério, Gregory Carvalho.
FONTE FOLHA DE SP
Em CTIs, 40% dos pacientes não recebem nutrição adequada
Um centro de tratamento intensivo (CTI) é um dos lugares com maior vigilância e assistência médica dentro dos hospitais. Mesmo assim, a desnutrição e a falta de ingestão calórica adequada são problemas nessas unidades, de forma semelhante ao que ocorre em outras alas de unidades de saúde.
Ao analisar os CTIs de 116 hospitais (públicos, privados e hospitais-escola) da América Latina, pesquisadores descobriram que 70% dos 1.053 pacientes estudados apresentavam desnutrição moderada ou grave mesmo recebendo terapia nutricional –procedimentos que auxiliam na nutrição do paciente internado.
Além disso, em cerca de 40% dos pacientes a ingestão calórica era inadequada.
"Eles recebiam a nutrição, mas havia um deficit. Ela era dada, mas não era suficiente para atingir o que o paciente precisava", afirma Maria Isabel Correia, médica especialista em nutrição da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e uma das autoras da pesquisa, publicada na revista "Critical Care", que analisou a situação nos hospitais.
Quadros de desnutrição que não recebem os cuidados necessários podem agravar o risco de morte, diminuir a eficácia e aumentar o tempo de tratamento dos pacientes, além de elevar a chance de reinternações –e consequentemente os custos hospitalares.
Segundo especialistas ouvidos pela Folha, os cuidados com o estado nutricional dos pacientes –tanto os que entram quanto os que já estão nos hospitais– costumam ser considerados como secundários.
"A equipe de saúde dá muito mais importância para outros medicamentos, coisas ligadas à sobrevivência aguda dos pacientes do que propriamente à dieta", diz Paulo Ribeiro, coordenador da equipe multiprofissional de terapia nutricional do Hospital SÃrio-Libanês.
No caso dos CTIs, contudo, há outro fator agravante –que, pelo menos em parte, pode explicar o elevado nÃvel de desnutrição encontrado pela pesquisa.
Ribeiro, que não participou do estudo, diz que pacientes com quadros graves de inflamação ou doenças agudas têm uma resistência sistêmica que dificulta a recuperação de massa muscular e tecidos. De forma geral, o corpo destina a nutrição recebida à defesa imediata do organismo.
O especialista afirma que, nesses casos, há dificuldades em balancear a carga calórica que o paciente recebe. "Conhecemos muito pouco desses mecanismos para poder burlá-los de forma efetiva."
De toda forma, "a doença mais prevalente nos hospitais no Brasil se chama desnutrição, algo que conseguimos tratar de uma maneira prática e muito menos cara do que outras terapias", diz Correia, que vem repetindo o alerta há anos.
REALIDADE HOSPITALAR
A pesquisadora da UFMG demonstrou, em outro estudo publicado em 2016, a elevada prevalência –de 40% a 60%– da desnutrição em pacientes internados.
O quadro, preocupante, não é recente, porém. Há mais de uma década a publicação do Inquérito Brasileiro de Avaliação Nutricional Hospitalar (Ibranutri) já demonstrava a situação de desnutrição entre pessoas internadas.
Para Correia, é importante a disseminação das equipes de terapia nutricional, além do monitoramento, a partir de auditorias, do seu funcionamento. "A terapia não pode ser vista como algo a mais, mas, sim, parte integral do cuidado do paciente."
Segundo José Aguilar do Nascimento, presidente da Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral, a formação nas faculdades de medicina pode ser um dos caminhos para que se preste mais atenção aos aspectos nutricionais durante internações.
Além disso, os próprios pacientes e seus familiares devem ficar vigilantes sobre a situação nutricional e, quando necessário, cobrar atenção quanto ao assunto. "A nutrição no hospital é um direito do doente", afirma Dan Waitzberg, professor do departamento de gastroenterologia da faculdade de medicina da USP.
Procurado pela reportagem, o Ministério da Saúde afirma que, no Brasil, há 424 hospitais habilitados para terapia nutricional, que devem contar com um grupo multiprofissional composto por, no mÃnimo, um médico, um nutricionista, um enfermeiro e um farmacêutico.
"Além do custeio, o Ministério da Saúde tem desenvolvido ações que visam o fortalecimento da Terapia Nutricional no âmbito hospitalar, entre elas, a elaboração de materiais e realização de cursos de capacitação dos profissionais que integram as Equipes Multiprofissionais de Terapia Nutricional", diz a pasta em nota.
FONTE FOLHA DE SP